Nº 630
Quaresma: história e espiritualidade
A Quaresma é o tempo do ano litúrgico preparatório da Páscoa, a grande celebração da salvação operada pela morte e ressurreição de Jesus Cristo. Começa na Quarta-Feira de Cinzas e termina na Quinta-Feira Santa, excluindo a Missa da Ceia do Senhor, que já pertence ao Tríduo Pascal.
A Quaresma surgiu no séc. IV, a seguir à paz do imperador romano Constantino, quando multidões de pagãos quiseram entrar na Igreja. Duas venerandas instituições a ela estão ligadas, a penitência pública e o catecumenado, preparação para o Batismo, o primeiro dos sete sacramentos. Daí o seu duplo caráter penitencial e batismal.
Inicialmente durava três semanas, mas depois, em Roma, foi alargada a seis semanas (40 dias), com início no atual I Domingo da Quaresma (na altura denominado Quadragesima die, entenda-se 40.º dia anterior à Páscoa). O termo Quadragesima (que deu a nossa “Quaresma”) passou depois a designar a duração dos 40 dias evocativos do jejum de Jesus Cristo no deserto, segundo a Bíblia, a preparar-se para a vida pública. Como, tradicionalmente, aos domingos nunca se jejuou, foi necessário acrescentar alguns dias para se perfazerem os 40. Daí a antecipação do início da Quaresma para a Quarta-Feira de Cinzas, que em 2012 começa a 22 de fevereiro.
Penitência
A Quaresma é um tempo forte de penitência. A atitude espiritual expressa por esta palavra, é suscitada pela consciência do pecado.
Começa por ser arrependimento pelo mal praticado e sincera dor do pecado; logicamente leva ao desejo de expiação e de reparação, para repor a justiça lesada, e de reconciliação com Deus e com os irmãos ofendidos; chega finalmente à emenda de vida e mais ainda à conversão cristã, que é muito mais que uma conversão moral, para ser uma passagem à fé e à caridade sobrenaturais, com tudo o que implica de mudança de mentalidade, sensibilidade e maneira de amar.
Jejum e esmola
Para assegurar expressão comunitária à prática penitencial, sobretudo no tempo da Quaresma, a Igreja mantém o jejum e a abstinência tradicionais. Embora estas duas práticas digam hoje pouco à sensibilidade dos fiéis, mantêm-se em vigor, com variantes de país para país.
Entre nós são dias de jejum para os fiéis dos 18 aos 59 anos (a menos de dispensa, por doença ou outra causa) a Quarta-Feira de Cinzas e a Sexta-Feira Santa (convidando a liturgia a prolongar o jejum deste dia ao longo de Sábado Santo). E são dias de abstinência de alimentos ricos, para os fiéis depois dos 14 anos, as sextas-feiras do ano (a menos que cesse a obrigação pela coincidência com festa de preceito ou solenidade litúrgica), com possibilidade de substituição por outras práticas de ascese, esmola (caridade) ou piedade, embora seja aconselhado manter a prática tradicional nas sextas-feiras da Quaresma.
No que respeita à esmola, ela deve ser proporcional às posses de cada um e significar verdadeira renúncia, podendo revestir-se da forma de “contributo penitencial”.
VIII DOMINGO DO TEMPO COMUM
A liturgia deste 8º Domingo do Tempo Comum propõe-nos uma reflexão sobre as nossas prioridades. Recomenda que dirijamos o nosso olhar para o que é verdadeiramente importante e que libertemos o nosso coração da tirania dos bens materiais. De resto, o cristão não vive obcecado com os bens mais primários, pois tem absoluta confiança nesse Deus que cuida dos seus filhos com a solicitude de um pai e o amor gratuito e incondicional de uma mãe.
O Evangelho convida-nos a buscar o essencial (o “Reino”) por entre a enorme bateria de coisas secundárias que, dia a dia, ocupam o nosso interesse. Garante-nos, igualmente, que escolher o essencial não é negligenciar o resto: o nosso Deus é um pai cheio de solicitude pelos seus filhos, que provê com amor às suas necessidades.
A primeira leitura sublinha a solicitude e o amor de Deus, desta vez recorrendo à imagem da maternidade: a mãe ama o filho, com um amor instintivo, avassalador, eterno, gratuito, incondicional; e o amor de Deus mantém as características do amor da mãe pelo filho, mas em grau infinito. Por isso, temos a certeza de que Ele nunca abandonará os homens e manterá para sempre a aliança que fez com o seu Povo.
Na segunda leitura, Paulo convida os cristãos de Corinto a fixarem o seu olhar no essencial (a proposta de salvação/libertação que, em Jesus, Deus fez aos homens) e não no acessório (os veículos da mensagem).
Dehonianos
MEDITAR
A QUE SABE A POESIA?
E, por fim, Deus regressa
carregado de intimidade e de imprevisto
já olhado de cima pelos séculos
humilde medida de um oral silêncio
que pensámos destinado a perder
Eis que Deus sobe a escada íngreme
mil vezes por nós repetida
e se detém à espera sem nenhuma impaciência
com a brandura de um cordeiro doente
Qual de nós dois é a sombra do outro?
Mesmo se piedade alguma conservar os mapas
desceremos quase a seguir
desmedidos e vazios
como o tronco de uma árvore
O mistério está todo na infância:
é preciso que o Homem siga
o que há de mais luminoso
à maneira da criança futura
José Tolentino Mendonça
CONTO (489)
TRANSFORMAR AS FRAQUEZAS EM FORÇAS
Certa vez um rapaz de dez anos, decidiu aprender e praticar judo, apesar de ter perdido o seu braço esquerdo num terrível acidente de carro.
Disposto a enfrentar as dificuldades e as suas limitações, começou as lições com um velho mestre oriental.
O rapaz ia bem, nos seus treinos. Mas, sem entender o porquê, após três meses de treino, o mestre tinha-lhe ensinado apenas um movimento. O rapaz perguntou ao mestre:
- Mestre! Não devo aprender mais movimentos?
O Mestre respondeu-lhe, calmamente e com convicção:
- Este é realmente o único movimento que tu sabes, mas este é o único que tu precisarás saber.
Sem entender, mas acreditando no seu mestre, o menino continuou a treinar. Meses mais tarde, o mestre inscreveu o rapaz no seu primeiro torneio.
Surpreendido, o rapaz ganhou com facilidade os seus primeiros dois combates. O terceiro combate foi o mais difícil, mas, depois de algum tempo, o seu adversário tornou-se impaciente e agitado. Foi, então, que o rapaz usou o seu único movimento para ganhar a luta.
Espantado ainda com o seu sucesso, o rapaz chegou ao final do torneio. Desta vez o adversário era bem maior, mais forte e mais experiente.
Preocupado com a possibilidade do rapaz se magoar, pensaram em cancelar a luta, quando o mestre interveio:
- De forma nenhuma! Deixem-no continuar.
Da mesma maneira, o rapaz usando os ensinamentos do mestre, entrou para a luta e, quanto teve oportunidade, usou o seu movimento para prender o adversário.
Foi assim que o rapaz ganhou a luta e o torneio.
Era o Campeão!
Mais tarde em casa, o rapaz e o mestre reviram cada movimento, em cada luta. Então, o rapaz criou coragem para perguntar o que estava na sua mente:
- Mestre, como eu consegui ganhar o torneio com apenas um movimento?
- Ganhas-te o torneio por duas razões – respondeu o mestre. – Em primeiro lugar, aprendeste um dos golpes mais difíceis do judo; em segundo lugar a única defesa conhecida para esse golpe é o adversário agarrar teu braço esquerdo.
Assim, a maior fraqueza do rapaz tinha-se transformado na sua maior força.Com esta lição, percebemos que nós também podemos usar as nossas “fraquezas” para que se transformem em nossa força.
Quando contemplamos a beleza de uma árvore nem sempre nos lembramos que o seu segredo está guardado nas suas raízes. Tem uma história que a fez erguer-se, que a tornou majestosa, mas se permaneceu, se cresceu, se resistiu às intempéries da vida, é porque as suas raízes se foram aprofundando. Cresceu em altura, mas também cresceu em profundidade. Há um mistério oculto que acompanha a sua vida, e todas as vidas.
Carlos Maria Antunes
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Nº 1170Pensamento da Semana
PENSAMENTO DA SEMANA
“ENSINAR É AMAR”
"Ser professor é dar-se (...) Tens muito que fazer? – Não; tenho muito que amar. Não entendo ser professor de outra maneira. (...)
Para ser professor, também é preciso ter as mãos purificadas. A toda a hora temos de tocar em flores. A toda a hora a Poesia nos visita. O aluno acredita em nós e não deve acreditar em vão. Impõe-se-nos que mereçamos, com a nossa, a pureza dos nossos alunos; que a nossa alimente a deles, a mantenha. (...)
Sejamos a lição em pessoa – que é isso mais importante e mais eficaz que sermos o papel onde a lição está escrita; e possamos dizer sem constrangimento: Deixai-as vir a mim, as criancinhas…”
Sebastião da Gama, in Diário
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